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A História Por Trás dos Clássicos de “Que País É Este” da Legião Urbana

A trajetória musical da Legião Urbana é marcada por uma série de clássicos que definiram não apenas a banda, mas também o cenário do rock brasileiro. Entre os destaques do álbum Que País É Este de 1987, estão as músicas “Eu Sei” e “Tédio”, que possuem histórias fascinantes e revelam aspectos profundos da juventude de Renato Russo e da banda.

“Eu Sei” – Uma Jornada de Transformação

“Eu Sei” foi escrita em 1982, quando Renato Russo tinha apenas 21 ou 22 anos, logo após sua saída do Aborto Elétrico, uma banda que também contava com os irmãos Feitosa, Flávio Lemos, hoje no Capital Inicial. Naquele período, Russo adotou o nome de “Trovador Solitário” e se dedicou a apresentações em shows pequenos e acampamentos, onde tocava suas composições solo.

Originalmente, a música tinha outro título, com duas possíveis grafias: “18 e 21” ou “Entre 18 e 21”. O significado por trás desses números é uma referência à idade de Renato na época em que a canção foi escrita. As primeiras gravações de “Eu Sei” foram feitas no apartamento da família Manfredini em Brasília e foram posteriormente lançadas no disco Trovador Solitário em 2008.

Um aspecto interessante dessa fase é o manuscrito original da letra, que data de 12 de março de 1982, poucos dias antes do aniversário de 22 anos de Renato. A versão inicial da letra apresentava diferenças significativas em relação à versão final, especialmente no refrão, onde “Eu Sei” era originalmente “Mas Eu Sei”. Essa mudança demonstra a evolução da música e o processo criativo de Renato.

Durante seus shows na fase de Trovador Solitário, a música já era conhecida em Brasília e tocada nas apresentações da Legião Urbana. “Eu Sei” foi considerada para o álbum Dois de 1986, que originalmente seria um disco duplo, mas acabou sendo reduzido a um álbum simples. Assim, “Eu Sei” não entrou no disco, apesar de sua popularidade crescente.

A canção também gerou curiosidade entre os fãs, que, sem saber o nome oficial da música, a chamavam de “Sexo Verbal”. Esse título curioso surge da relação da música com uma época em que as conversas ao telefone eram uma forma comum de paquera, e “Sexo Verbal” era uma expressão coloquial para esses diálogos.

“Tédio” – A Reflexão da Juventude

A música “Tédio” é um reflexo direto da adolescência de Renato Russo, escrita em 1979 para o Aborto Elétrico. Naquela época, Brasília enfrentava uma escassez de opções de lazer, e Renato utilizou sua música para criticar o tédio que permeava a cidade. Em um manifesto escrito na época, Renato clamava pelo fim do tédio e pela agitação na “Jovem Cidade Morta”.

“Tédio” foi inicialmente apresentada à censura em novembro de 1981. A letra original fazia referência ao presidente da época, João Batista Figueiredo, e criticava o clima de estagnação em Brasília. A música foi cotada para o primeiro álbum da Legião, mas acabou sendo deixada de fora devido à presença de uma canção com o mesmo nome do Biquíni Cavadão.

Interessante notar que a versão de “Tédio” que foi finalmente gravada no álbum Que País É Este foi a terceira tentativa de incluir a música na discografia da banda. O título longo com a expressão entre parênteses é uma homenagem aos clássicos do rock, como “A Day in the Life” dos Beatles, refletindo a admiração de Renato pelos ícones do rock internacional.

“Química” – A Desilusão Escolar

“Química” é uma canção que nasceu da frustração de Renato Russo com o sistema educacional. Escrito em 1981 para o Aborto Elétrico, a música reflete a aversão de Renato por matérias como química, física e matemática, e o seu desejo de escapar dessas responsabilidades escolares. A canção, com seu tom irônico e humorístico, foi uma das últimas compostas antes da dissolução da banda.

A descoberta da Legião Urbana pela gravadora EMI foi, em parte, devido a “Química”. Durante uma sessão de gravação dos Paralamas do Sucesso em 1983, Herbert Vianna incluiu a música no repertório, o que chamou a atenção de Jorge Davidson, diretor artístico da gravadora. Davidson ficou curioso sobre Renato Russo e pediu uma fita com suas gravações, o que levou à assinatura do contrato de gravação da Legião.

Embora “Química” tenha sido cotada para o álbum Dois, a faixa não foi incluída no disco final devido ao limite de espaço no vinil. A canção foi, no entanto, inserida no formato cassete da época, mas não no CD quando o álbum foi relançado em formato digital.

A Influência dos Beatles e a Comparação com a Legião

Uma curiosidade interessante sobre “Eu Sei” é a comparação feita por técnicos da Abbey Road Studios durante a remasterização dos discos da Legião em 1995. Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, durante a remasterização, foram surpreendidos ao ouvir um técnico inglês comentar que a canção lembrava os Beatles, especificamente o som de “Tomorrow Never Knows”. Renato Russo, em uma entrevista, expressou sua felicidade com a comparação, refletindo a influência marcante dos Beatles na música da Legião Urbana.

A riqueza das composições da Legião Urbana, como “Eu Sei”, “Tédio” e “Química”, não se resume apenas à sua musicalidade, mas também às histórias e contextos que moldaram essas músicas. Através da análise dessas canções, podemos entender melhor a juventude e a visão crítica de Renato Russo, bem como a evolução da banda ao longo dos anos. A jornada de Renato, desde seus primeiros passos como Trovador Solitário até o impacto duradouro da Legião Urbana, continua a inspirar e influenciar novas gerações de músicos e fãs.

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