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A ascensão da música clássica entre a Geração Z e millennials: O novo público do gênero

A música clássica, com suas complexas composições e ambientes elitistas, foi, por muito tempo, considerada um domínio restrito para um público específico e conservador. No entanto, nos últimos anos, uma surpreendente reviravolta tem ocorrido. A Geração Z e os jovens millennials têm se engajado com a música clássica de maneiras inovadoras, transformando o que antes parecia um campo distante e inacessível em algo moderno e interessante. Este fenômeno, que envolve tanto uma reinterpretação do gênero quanto a utilização de plataformas digitais para uma conexão mais próxima com os fãs, tem quebrado barreiras, tornando a música clássica “cool” novamente.

O Renascimento da Música Clássica nas Gerações Jovens

De acordo com uma pesquisa realizada pela Royal Philharmonic Orchestra (RPO) em 2022, 74% dos jovens do Reino Unido com menos de 25 anos ouviram música clássica durante a temporada de Natal, enquanto apenas 46% dos indivíduos com mais de 55 anos fizeram o mesmo. Esse dado é um reflexo de uma tendência crescente de jovens se conectando com o gênero clássico, uma mudança significativa, considerando que a música clássica sempre foi associada à elite e a um público mais velho. Mas o que tem levado as novas gerações a reavaliar sua relação com compositores como Bach, Mozart e Beethoven?

Diversos fatores explicam esse ressurgimento da música clássica entre os jovens. Um deles é, sem dúvida, a democratização das plataformas de streaming, como Spotify e Apple Music. Com as listas de reprodução sugeridas por algoritmos, os ouvintes têm acesso fácil e imediato a uma variedade de estilos musicais, incluindo a música clássica. Além disso, a música clássica tem sido cada vez mais incorporada à cultura pop. Sucessos como a série “Squid Game” e os videoclipes inovadores de artistas contemporâneos ajudaram a aproximar o gênero de novas audiências.

Outro fator crucial para esse fenômeno é o impacto das redes sociais, especialmente o TikTok e o Instagram. Artistas como a violinista Esther Abrami, com mais de 250.000 seguidores no Instagram e 380.000 no TikTok, têm aproveitado essas plataformas para compartilhar sua paixão pela música clássica de forma mais acessível e descontraída. Essa popularização digital não só quebra a barreira de elitismo associada ao gênero, mas também humaniza os músicos, permitindo que eles se conectem com seus seguidores de maneira mais direta e pessoal.

A Influência das Redes Sociais no Renascimento da Música Clássica

No caso de Abrami, ela começou sua jornada digital para combater a sensação de isolamento que sentia ao estudar em uma instituição de música de elite. “Eu estava estudando em uma instituição de ponta e, na maior parte do tempo, estava praticando para os exames, então toda a alegria de compartilhar foi tirada”, ela explica. O impacto dessa mudança foi imediato. Ao compartilhar vídeos tocando violino nas redes sociais, ela descobriu que sua música estava tocando pessoas ao redor do mundo, algo que ela nunca imaginara antes.

Babatunde Akin Boboye, outro artista clássico digitalmente influente, tem uma história semelhante. Este barítono nigeriano, conhecido por sua mistura de ópera e hip-hop, ganhou notoriedade ao postar um vídeo de si mesmo cantando uma ária de Rossini sobre a batida de Kendrick Lamar. O sucesso foi estrondoso, fazendo com que sua marca de “hip-hopera” chamasse a atenção de programas de TV como o The Ellen Show e America ‘s Got Talent. Para Akin Boboye, o poder da internet é inegável: “É muito sobre como me identifico com a ópera; minha formação musical era do hip-hop, mas ainda encontrei um relacionamento com a ópera e isso ressoou com as pessoas.”

Esses exemplos são apenas a ponta do iceberg quando se trata de como as mídias sociais estão redefinindo o gênero clássico. Artistas que se sentem conectados ao mundo pop ou urbano estão reimaginando a música clássica de maneiras que a tornaram mais atraente e acessível para os jovens. A mistura de gêneros e a flexibilidade dos músicos modernos em se expressar de forma autêntica são elementos-chave para esse renascimento. A mídia social permitiu que esses músicos não apenas mostrassem suas habilidades técnicas, mas também revelassem suas histórias pessoais, criando uma conexão mais profunda com seu público.

O Papel do “Classictok” na Redefinição do Gênero

O fenômeno do “Classictok” (nome dado à vertente da música clássica no TikTok) exemplifica esse renascimento. Com 53,8 milhões de visualizações na hashtag #Classictok, esse espaço digital tem sido crucial para a disseminação de conteúdo clássico para um público mais jovem. Artistas e influenciadores estão transformando a maneira como as pessoas consomem a música clássica. Para muitos, a plataforma é um ponto de entrada para o mundo da música orquestral e da ópera, proporcionando não apenas acesso à música, mas também uma nova forma de experimentá-la e apreciá-la.

Músicos como Harriet Stubbs, uma pianista britânica que realizou uma série de shows durante o confinamento, têm encontrado formas inovadoras de manter a música clássica relevante e interessante para o público moderno. Stubbs, por exemplo, fez shows em seu apartamento, abrindo as janelas para alcançar um público maior, além de incorporar elementos populares em suas apresentações, como a música de “All By Myself”. Sua estratégia ajudou a expandir seu público, com muitas pessoas retornando à sua música diariamente por conta do poder emocional que ela evoca.

O Impacto Estético da Música Clássica

Além de ser uma prática musical, a música clássica também se tornou parte de um movimento estético mais amplo, particularmente nas microtendências digitais como o Dark Academia e o Light Academia. Essas subculturas celebram a arte, a literatura e o conhecimento, frequentemente com uma trilha sonora de composições clássicas que evocam uma sensação de nostalgia e profundidade intelectual. Artistas como Jakub Józef Orliński, com sua abordagem visualmente cinematográfica da música barroca, e as gravações de Kris Bowers de músicas pop modernas para séries como “Bridgerton” demonstram como a música clássica pode ser reinterpretada e modernizada para se alinhar com as tendências culturais atuais.

Orliński, conhecido por sua impressionante habilidade vocal e por suas interpretações inovadoras, é um exemplo de como a música clássica está sendo contemporizada e integrada à cultura pop. Seu trabalho não se limita a performances em palco, mas também inclui colaborações com videogames e outros projetos multimídia, como um filme que acompanha sua versão de “Stabat Mater” de Vivaldi. Esse tipo de inovação tem sido crucial para atrair o público jovem que busca algo mais interativo e imersivo, sem perder a profundidade e a complexidade que a música clássica oferece.

A Música Clássica Como “Cool”

O interesse renovado pela música clássica entre a Geração Z e os millennials não é apenas uma questão de nostalgia, mas uma verdadeira reinvenção do gênero. A combinação de artistas inovadores, mídias sociais e influências culturais populares está ajudando a reescrever o papel da música clássica na cultura contemporânea. O movimento crescente, liderado por artistas como Abrami, Akinboboye e Orliński, está desafiando as antigas concepções sobre a música clássica como um campo restrito e elitista. Ao fazer isso, eles estão criando um espaço no qual a música clássica pode ser apreciada por um público mais jovem, moderno e diverso.

Com cada vez mais jovens ouvindo, assistindo e criando música clássica, o futuro desse gênero parece mais vibrante do que nunca. Talvez, em breve, seja impossível pensar em música clássica sem lembrar a energia inovadora trazida por essas novas vozes e a forma como elas conseguiram conquistar um novo público através das plataformas digitais.