A indústria da música, sempre vista como um espaço de glamour e sucesso, esconde em suas entrelinhas uma realidade muitas vezes cruel, especialmente para artistas emergentes. Durante o último Grammy, Chappell Roan — conhecida pelo hit Pink Pony Club — subiu ao palco para receber o prêmio de Melhor Artista Novo e surpreendeu a todos ao usar seu momento de destaque para fazer um discurso emocionante sobre os direitos dos músicos e as dificuldades enfrentadas por profissionais da área.
Roan não apenas falou. Ela agiu. Doando generosos US$ 25.000 (cerca de £20.000) para a Backline, uma instituição de caridade que oferece apoio à saúde mental para trabalhadores da música, a artista deu o pontapé inicial em um movimento que rapidamente ganhou tração. Seu discurso não foi apenas inspirador, mas também o estopim para uma avalanche de solidariedade na indústria, com artistas como Charli XCX e Noah Kahan seguindo seu exemplo e contribuindo para a causa.
Hilary Gleason, diretora da Backline, destacou o impacto desse gesto. Em entrevista à BBC Newsbeat, Gleason revelou que a segunda-feira após o discurso foi o “maior dia de arrecadação de fundos” na história da instituição. “Nós realmente apreciamos que ela tenha usado esse momento para chamar a ação para mudar a indústria da música”, disse Hilary, reconhecendo que o esforço de Chappell pode ser um divisor de águas, embora mudanças sustentadas ainda exijam um esforço coletivo e a colaboração de toda a comunidade musical.
A Luta Invisível dos Artistas
Chappell Roan não foi a única a trazer questões delicadas à tona. Durante seu discurso, ela compartilhou suas dificuldades ao ser abandonada por sua gravadora durante a pandemia. Sem contrato e sem fonte de renda, a artista enfrentou uma dura batalha para conseguir um emprego e pagar por um seguro de saúde.
Essa história, infelizmente, não é um caso isolado. “O sucesso na indústria da música parece diferente para todos”, disse Hilary Gleason, mas muitas das dificuldades são comuns. A falta de orientação no início da carreira, os contratos desvantajosos e a vida na estrada muitas vezes levam a uma combinação explosiva de estresse, isolamento e problemas de saúde mental.
Como apontado por Gleason, a turnê pode ser especialmente desgastante. “Esse estilo de vida envolve muito tempo longe de casa, pode ser muito difícil para os relacionamentos, e há frequentemente um uso elevado de substâncias”, explicou ela. Não são apenas os artistas que enfrentam essa pressão, mas também motoristas de ônibus, técnicos e outros profissionais que fazem parte das turnês.
“Por Que Minha Paixão Me Faz Sofrer?”
O cantor Jeff Draco, de 24 anos, também compartilhou sua experiência com a BBC Newsbeat. “As coisas podem parecer muito pesadas quando é a sua principal paixão. É como, essa é a coisa que eu mais amo — por que isso está me machucando agora?”, refletiu.
Quando começou a se apresentar há seis anos, Jeff disse que lutou para manter a saúde mental e não tinha ninguém a quem recorrer para pedir apoio. Esse cenário é o que a Backline tenta mudar, oferecendo suporte não apenas para artistas, mas também para todos os profissionais do setor musical.
Ainda assim, tanto Jeff quanto Hilary concordam que mudanças mais profundas são necessárias. Eles defendem uma reforma estrutural na indústria, incluindo maior suporte das gravadoras e orientação para artistas emergentes, algo ainda raro no cenário atual.
Uma Indústria Que Precisa Evoluir
O relatório de 2023 da instituição de caridade Help Musicians reforça essas preocupações. O estudo revelou que 44% dos artistas no Reino Unido identificaram a falta de uma renda sustentável como uma barreira significativa para suas carreiras. Outros 23% afirmaram não conseguir sustentar a si mesmos ou suas famílias com a renda gerada pela música.
Enquanto isso, Jeff Rabha, executivo musical e colunista do Hollywood Reporter, trouxe um contraponto polêmico. Em sua coluna, ele argumentou que as gravadoras não são instituições de caridade e que os artistas não são funcionários tradicionais. Chamando Chappell Roan de “falsa”, ele criticou a artista por “lucrar com a mesma indústria que está criticando”.
Rabah, no entanto, não respondeu ao desafio público de Chappell para igualar sua doação à Backline. Sua ausência de resposta só reforça o discurso da cantora de que a indústria precisa de mais responsabilidade e ações concretas. “Compartilhar minha experiência pessoal no palco do Grammy não era para ser um band-aid financiado coletivamente”, escreveu Chappell em seu Instagram. “Mas um chamado à ação para que os líderes da indústria se posicionem e nos ajudem a fazer mudanças reais.”
O Caminho para o Futuro
A visão de Hilary Gleason para a Backline vai além do apoio emergencial. Ela defende uma estrutura de suporte abrangente que acompanhe os artistas desde o momento em que entram na indústria até a aposentadoria. Isso inclui acesso a cuidados de saúde, suporte psicológico e programas de orientação para evitar que talentos promissores sejam perdidos por causa de problemas evitáveis.
Enquanto isso, a luta de artistas como Chappell Roan continua a inspirar uma nova geração de músicos a exigir mudanças reais. O futuro da indústria musical pode ser mais saudável e sustentável, mas, como Hilary destacou, “esse é um jogo longo” — e cada pequena vitória importa.