No artigo de hoje vamos analisar o que o super herói Incrível Hulk, o poeta inglês William Butler e o cantor Zé Ramalho têm em comum.
Vamos descobrir como um trecho de uma história em quadrinhos inspirou uma das melhores músicas da MPB.
Mas qual a ligação entre os quadrinhos do Incrível Hulk e a Música de Zé Ramalho?
Na verdade, a ligação é que eles tem um trecho do texto da revista usado na poesia da música. Do mesmo modo, a revista utiliza como inspiração um trecho do poema do poeta inglês, William Butler como referência.
Em decorrência disso, foram criadas pequenas polêmicas e mal entendidos.
O Processo de Criação da Música Força Verde
Então, a música Força Verde, faz parte do álbum do mesmo nome, lançado no ano de 1982. Ao passo que, esse é considerado um dos melhores trabalhos da carreira de Zé Ramalho. Visto que, é o resultado da sinergia de uma sequência de sucessos com trabalhos anteriores.
Segundo o próprio artista, esse disco foi o mais místico que já produziu. Só para ilustrar, vem recheado de histórias com referências mitológicas e bíblicas. similarmente, faz ênfase ao apocalipse e fim do mundo.
Zé Ramalho gravou esse disco nos estúdios LEVEL, e o produziu. Bem como. contou com a participação de Fagner e de Elba Ramalho.
Mas, infelizmente, por razões estranhas à vontade do artista, esse trabalho teve vida curta. Fruto, ao meu entender, de uma acusação sensacionalista por parte da imprensa e polêmicas desnecessárias.
A razão dessa reviravolta foi o fato da letra da faixa-título trazer um trecho da tradução para o português das páginas iniciais da revista do Incrível Hulk. Por conseguinte, a revista traz um trecho do poema do dramaturgo e poeta irlandês William Buttler Yeats. Em virtude disso, a polêmica se deu.
Qual o Poema de Buttler usado na Revista?
De fato, William Buttler, foi um poeta e dramaturgo Inglês e prêmio Nobel de Literatura em 1923.
O poema, em questão, se chama “As Penas do Amor”, e é um poema romântico que foi publicado no ano de 1891.
Na realidade, o que foi usado, nem foi a tradução literal do poema, e sim um trecho do poema publicado na revista em quadrinhos. Por outro lado, o trecho da revista nem foi publicado na integralidade, e sim serviu como inspiração.
Como surgiu a relação com a Revista do Hulk?
A princípio, essa história começou quando um colecionador de revistas em quadrinhos e grande fã de super heróis, ouviu a música no programa fantástico da rede Globo. Essa pessoa ao assistir o vídeo clipe, identificou o trecho do texto da revista e localizou a mesma em sua coleção.
Há quem diga, que esse colecionador se trata de Emir Ribeiro, desenhista e editor de revistas em quadrinhos. Contudo, não conseguimos a confirmação dessa informação.
Por outro lado, isso seria bem possível, pois Emir Ribeiro é paraibano. E por acaso, a denúncia foi feita a um jornal do estado da Paraíba.
De antemão, essa pessoa, que era paraibano, levou o caso ao jornal “A União”, da cidade de João Pessoa. Nessa mesma época, o redator Wellington Farias, publicou uma matéria onde confrontava os dois textos, inclusive com imagens da revista.
As Críticas Sensacionalistas a Música Força Verde
Foi nesse mesmo tempo que o apresentador Flávio Cavalcante, tomou conhecimento do fato. Sabendo disso, trouxe o tema para o seu programa.
Flávio Cavalcante apresentava um programa de caráter sensacionalista, transmitido em rede nacional.
Desse modo, parte da imprensa nacional passou a tratar o caso como um escândalo. Posto que o próprio autor não conseguia dar explicações sobre o ocorrido. Esse, Zé Ramalho, limitou-se a dizer que se tratava de um grande mal entendido.
A Posição da Marvel Sobre o Ocorrido.
Sabe-se que a revista do Incrível Hulk, é editada pela Marvel Comics. Por isso, Stan Lee, seu editor, responsável pela revista, foi procurado pela imprensa brasileira.
Porém o mesmo não quis se manifestar. Pois a própria Editora não havia creditado os direitos da obra poética na revista em quadrinhos. Ou achou que o caso era irrelevante e não merecia atenção.
Nesse período, a música já vinha sendo distribuída em um compacto promocional para divulgar o disco. Essa fazia um grande sucesso e tocava nas rádios de todo o Brasil. Tocou sem problemas até que o fato veio a público.
Vale ressaltar, que apesar de tudo, essa obra ainda teve 150 mil cópias vendidas. Da qual, essa vendagem foi impulsionada por uma cara campanha publicitária, já que a gravadora CBS acreditava no sucesso do cantor.
Até que a Poeira do Hulk Baixasse.
Nesse momento, a gravadora CBS, temerosa com um processo de indenização, resolveu suspender a distribuição dos discos. E deu férias para Zé Ramalho, Graças a isso, o mesmo ficou dois anos afastado até que o assunto fosse totalmente esquecido.
Analogamente, naquele ano, o mesmo programou o início da sua carreira internacional. Ele planejava gravar um disco em espanhol que seria lançado no festival de Montreal. Infelizmente, isso não aconteceu.
A Poesia contida na Revista do Hulk.
Todavia, a história com a revista é um pouco mais antiga do que o lançamento do disco. Esse fato data do ano de 1976, quando Zé Ramalho havia recém chegado ao Rio de Janeiro, vindo da Paraíba.
Naquele tempo, o mesmo gostava de ler revistas em quadrinhos, e foi folheando o gibi do “Incrível Hulk”, que reparou nos balões de determinada história. Nesse momento, percebeu que a história continha uma poesia.
Então resolveu fazer uma música inspirado naquilo. Do qual, finalmente quando quis gravá-la para seu disco, em abril de 1982, falou com seu produtor sobre o fato.
O mesmo não obteve esclarecimento e inclusive ouviu um comentário dizendo: “Que certa feita Roberto Carlos musicou uma fotonovela, achando que não haveria problema”.
Como dito anteriormente, a revista em questão tratava-se da versão nacional de O Incrível Hulk, publicada em 1972.
A Versão Americana da Revista.
Igualmente, nos Estados Unidos essa edição foi publicada sob o número 138, em abril de 1971. A curiosa história foi escrita por Roy Thomas e desenhada por
A história dessa revista conta com a participação do homem areia, tradicional inimigo de Hulk. O quadrinho foi publicado pela primeira vez no Brasil, sob edição de número 1, chamando-se “O Incrível Hulk”. No Brasil, essa revista era licenciada para a GEA, Grupo de Editores Associados. O título do episódio é “O terrível destino de Betty Ross”.
Mais tarde, essa mesma história seria republicada pela Bloch e pela Rio Gráfica. Editoras que compraram os direitos de publicação da Marvel.
Não Obstante, e o Poema de Buttler?
Voltando ao poema, o roteirista, Roy Thomas usou um pequeno trecho do poema de Buttler, como narração nas primeiras páginas. Por coincidência, o poema foi usado sem citar o autor, pelo menos na edição nacional.
Seja como for, cada Editora faz a sua própria tradução da história para o português. Sendo que a versão utilizada pelo cantor foi a publicada na edição de 1972, pela GEA.
Logo, na verdade, o que o compositor realmente utilizou, foi a tradução para o português da introdução escrita de Roy Thomas.
Finalmente, Zé Ramalho registrou a composição como de sua autoria. Não teve preocupação de creditar a referência ao poema ou a revista.
Como dito anteriormente, o editor da revista também não o fez. O mesmo omitiu os créditos ao poeta irlandês, William Buttler.
Veja o trecho contido no Gibi.
Como não adianta ficar falando sem mostrar os fatos, ouça a transcrição do trecho que se encontra na revista:
“Ainda a pouco era apenas uma estrela candente
Parecia como uma imensa tocha antes do mergulho
Agora vem a tona
Sua ira é intensa
Se Você deseja saber
Se há algo que possa acalmar-lhe outra vez
Os pássaros, a lua cheia e todo o céu leitoso
Todas as formas da natureza
Foram destruídas pela imagem do homem e seu choro
A moça dos lábios vermelhos mostrava toda a grandeza do mundo em lágrimas
Condenado como Ulisses
Como Príamos morto com seus companheiros
Reapareceu no momento em que a lua ia se elevando
Todo pranto
Forma-se a Imagem do Homem e seu lamento.”
Veja o Poema traduzido
Agora ouça também, a tradução para o português do poema de Butler:
“Sobre os telhados a algazarra dos pardais,
Redonda e cheia a lua – e céu de mil estrelas,
E as folhas sempre a murmurar seus recitais,
Havia esquecido o mundo e suas mazelas.
Então chegaram teus soturnos lábios rosas,
E junto a eles todas as lágrimas da terra,
E o drama dos navios em águas tempestuosas
O drama dos milhares de anos que ela encerra.
Agora, no telhado a guerra dos pardais,
A lua pálida, e no céu brancas estrelas,
De inquietas folhas, cantilenas sempre iguais,
Estão tremendo – sob o mundo e suas mazelas.”
Mas será que a Revista Utiliza mesmo o Poema?
Sinceramente, não vi uma grande semelhança entre o poema de Buttler e o trecho da revista. Mais vale lembrar que essa é uma tradução, adaptada para que minimamente sejam mantidas as rimas e métricas do poema.
Pelo menos não se trata de uma cópia clara. Está mais para uma adaptação que utiliza elementos do poema no enredo da história como inspiração.
Por outro lado, a música de Zé Ramalho utiliza muitos elementos do texto das páginas iniciais da revista.
A despeito, faz algumas adaptações, provavelmente para caber na métrica da música. Identicamente chega a alterar um pouco o sentido da história.
Pois na música o autor fala de uma suposta ameaça, com tom apocalíptico, característico de sua obra.
Já na revista o texto fala da fúria descontrolada do personagem Hulk e os danos que ela pode causar ao mundo.
Com esses fatos, a confiança do artista junto à gravadora ficou abalada.
Vale evidenciar, que em tudo isso existe uma ingenuidade característica de uma época.
Curiosidades Sobre o Hulk e Zé Ramalho.
Um fato interessante sobre a gravação dessa música é que em um trecho o cantor parece dizer a palavra HULK.
Vale a pena dizer ainda, que essa música é muito boa e compensa ouvir. A mesma trata-se de uma obra extraordinária e um marco da cultura pop nacional..
Em síntese, falamos sobre quatro temas que nós gostamos: quadrinhos, super herois, poesia e música brasileira.
Dito isso, hoje fica claro que Zé Ramalho é um grande fã de quadrinhos, pois encontramos em sua obra outras referências de cultura nerd.
Um exemplo, é a música “Admirável Gado Novo”, onde fica claro a referência a obra “Admirável Mundo Novo” de Aldous Huxley.
Ou então a música Kryptônia, que se assemelha muito a história do super homem.
Também existe a alegação de que no mesmo álbum, na música “Mulher Nova Bonita e Carinhosa”, o artista tenha usado elementos de outra canção.
Seria essa uma canção feita pelo repentista e poeta popular, José Gonçalves de Campina Grande.
O episódio envolvendo “Força Verde” é um exemplo fascinante de como a cultura pop e a literatura podem se interconectar de maneiras inesperadas. A influência dos quadrinhos e da poesia na música de Zé Ramalho revela a profundidade e a complexidade de sua obra, bem como o impacto que questões de direitos autorais podem ter na carreira de um artista.
Além disso, o caso ilustra a complexidade da adaptação de obras literárias e poéticas para diferentes mídias. A adaptação de um poema para uma revista em quadrinhos e, subsequentemente, para uma música, mostra como a inspiração pode ser transformada e reinterpretada ao longo do tempo.
Se preferir, ouça um podcast sobre o assunto:
Acho que você fez uma boa síntese, cara. Quem ler essa reportagem aqui terá a versão mais completa e limpa do caso todo. Em outros blogs ainda existe uma linguagem que compra essa narrativa sensacionalista que pontuara.
Abraço e sucesso.
Obs: A música é realmente excelente!
Obrigado pelo comentário.