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Dalton Trumbo: A Lista Negra de Hollywood e a Resistência de um Roteirista

Em 22 de junho de 1950, o panfleto Red Channels foi publicado, acusando algumas das maiores estrelas de Hollywood de serem comunistas. Esse evento marcou um dos capítulos mais sombrios da indústria do entretenimento durante o período conhecido como Red Scare – a caçada anticomunista nos Estados Unidos. Entre as vítimas estava Dalton Trumbo, um dos roteiristas mais talentosos de sua geração. Trumbo, responsável por roteiros icônicos como Roman Holiday (1953) e Spartacus (1960), foi acusado de disseminar ideias subversivas através de seus filmes e preso.

Ao ser entrevistado pela BBC em 1960, Trumbo já havia superado parte das adversidades impostas pela lista negra de Hollywood. Sentado à beira de sua piscina em Hollywood, ele conversava com o jornalista Robert Robinson. Apesar do recente sucesso com seus roteiros, Robinson notou uma certa reticência no escritor, compreensível após os anos de perseguição. Afinal, Trumbo havia sido preso, colocado na lista negra e forçado a trabalhar sob pseudônimos para garantir seu sustento. Tudo isso por se recusar a responder ao Comitê de Atividades Antiamericanas da Câmara (HUAC) em 1947 sobre sua afiliação política, alegando seu direito constitucional à liberdade de pensamento.

A Caça às Bruxas em Hollywood

A perseguição política que vitimou Trumbo e outros artistas nasceu de um contexto complexo. O Comitê de Atividades Anti Americanas (HUAC) foi criado em 1938 para investigar possíveis ameaças subversivas, especialmente comunistas. No entanto, com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, as alianças políticas se tornaram instáveis. Quando a Alemanha nazista invadiu a União Soviética em 1941, os Estados Unidos e a Rússia comunista se tornaram aliados temporários, o que influenciou o conteúdo das produções cinematográficas de Hollywood.

Filmes como Missão a Moscou (1943), dirigido por Michael Curtiz, refletiam essa mudança de postura, promovendo uma visão mais simpática dos soviéticos. No entanto, quando a guerra terminou, a relação entre Estados Unidos e União Soviética rapidamente se deteriorou, dando início à Guerra Fria e ao ressurgimento das tensões políticas internas.

Em 1947, Trumbo foi um dos dez roteiristas e diretores convocados a depor perante o HUAC. Perguntado se era membro do Partido Comunista, Trumbo respondeu desafiadoramente: “Gostaria de ver as provas que sustentam essa questão.” Sua recusa em cooperar levou à sua prisão por desacato ao Congresso, além de ser banido da indústria cinematográfica.

O Red Channels e a Ampliação da Perseguição

O HUAC não foi o único responsável pela perseguição a supostos comunistas em Hollywood. Em 1950, o panfleto Red Channels foi publicado, listando 151 artistas acusados de ligações com o comunismo. Entre os mencionados estavam grandes nomes como os atores Edward G. Robinson e Orson Welles, o escritor Arthur Miller é o compositor Leonard Bernstein. Ter o nome mencionado em Red Channels poderia significar o fim de uma carreira.

Para Trumbo, as consequências foram devastadoras. No mesmo mês em que Red Channels foi publicado, ele foi enviado para a Instituição Correcional Federal de Ashland, em Kentucky, onde passou 11 meses. Após sua libertação, encontrava-se sem perspectivas de trabalho e financeiramente arruinado. Foi então que ele se mudou com a família para a Cidade do México, onde viveu por dois anos antes de retornar aos Estados Unidos.

A Resistência Criativa: Trabalhando no Submundo

Impedido de assinar seus roteiros, Trumbo adotou pseudônimos e recorreu ao mercado negro de roteiros para sobreviver. Sob o nome fictício de Robert Rich, ganhou um Oscar pelo roteiro de The Brave One (1957). Durante esse período, escreveu também para filmes B, mas nunca abandonou sua qualidade literária. O ponto de virada veio em 1960, quando dois grandes filmes – Exodus, dirigido por Otto Preminger, e Spartacus, estrelado por Kirk Douglas – marcaram seu retorno oficial à indústria cinematográfica.

Kirk Douglas, em particular, foi fundamental para a reintegração de Trumbo. Ele insistiu que o nome verdadeiro do roteirista fosse creditado em Spartacus, quebrando o tabu da lista negra de Hollywood. Esse gesto corajoso contribuiu para desmantelar o sistema de exclusão, permitindo que outros artistas perseguidos voltassem a trabalhar sem restrições.

Reparação Tardia e Legado

Dalton Trumbo viveu para testemunhar a derrubada da lista negra e a recuperação de sua reputação. Em 1975, recebeu oficialmente seu Oscar por The Brave One. Décadas depois, em 1993, foi reconhecido postumamente com o Oscar pelo roteiro de Roman Holiday. Sua história foi imortalizada no filme Trumbo (2015), estrelado por Bryan Cranston, que foi indicado ao Oscar por sua interpretação do roteirista.

No final de sua vida, Trumbo refletia sobre o impacto da lista negra. Embora tivesse conseguido reconstruir sua carreira, ele reconhecia que outros não tiveram a mesma sorte. “O sucesso de alguns não deve atenuar a tragédia do que aconteceu”, disse. “Foi uma época terrível.”

Dalton Trumbo deixou um legado de resistência, coragem e criatividade em meio à adversidade. Sua trajetória simboliza a luta pela liberdade de expressão em um dos períodos mais conturbados da história americana, lembrando-nos do preço alto que pode ser pago quando o medo e a intolerância tomam o controle.