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Kendrick Lamar no Super Bowl: Um Intervalo Revolucionário e Polêmico

Kendrick Lamar redefiniu o intervalo do Super Bowl com uma apresentação ousada e cheia de mensagens políticas, gerando controvérsia e aplausos. Entenda o impacto cultural.

A apresentação de intervalo do Super Bowl de 2024, protagonizada por Kendrick Lamar, não foi apenas a mais assistida da história, com mais de 133 milhões de espectadores — foi também uma das mais ousadas e intransigentes. Enquanto artistas anteriores usaram o palco do Super Bowl para apresentar seus maiores sucessos, Lamar optou por um caminho radicalmente diferente. Ele tocou apenas trechos de duas músicas antigas, concentrando-se principalmente em seu aclamado álbum mais recente, *GNX*, e em seu hit contundente, “Not Like Us”, uma faixa que eviscera Drake de forma implacável. 

No mais recente episódio do podcast *Rolling Stone Music Now*, os críticos Brittany Spanos e Rob Sheffield se juntaram ao apresentador Brian Hiatt para analisar a apresentação de Lamar e tentar entender por que uma performance tão virtuosa de um dos maiores artistas do século XXI gerou tanta controvérsia. A discussão revelou insights fascinantes sobre a natureza do intervalo do Super Bowl, a política na música e a divisão cultural que define os Estados Unidos hoje.

 Drake: O Personagem Invisível do Show  

Um dos aspectos mais intrigantes da apresentação de Lamar foi a presença invisível de Drake. Como Sheffield apontou, “não consigo pensar em outro momento na história em que um artista fez um show de intervalo do Super Bowl inteiro sobre outro artista que nunca fez o intervalo do Super Bowl”. Lamar não mencionou Drake diretamente, mas a escolha de incluir “Not Like Us” — uma música que muitos interpretam como um ataque direto ao rapper canadense — transformou Drake em uma figura central, mesmo que ele nunca tenha pisado no palco.

Essa decisão foi um movimento arriscado, mas também brilhante. Ao invés de se concentrar em seus clássicos, Lamar usou o palco global do Super Bowl para reforçar sua relevância atual e reafirmar seu lugar no topo do hip-hop. Como Spanos observou, “nossa ideia de um show de intervalo do Super Bowl tem sido um destaque de toda a carreira de uma pessoa”. Lamar, no entanto, desafiou essa expectativa, optando por um setlist que priorizou seu trabalho mais recente e suas mensagens mais urgentes.

 O Desafio de Apresentar Músicas Novas  

A decisão de Lamar de focar em material novo foi, sem dúvida, um desafio para parte do público. Enquanto artistas como os Rolling Stones e Justin Timberlake já haviam incluído músicas recentes em suas apresentações no Super Bowl, ninguém jamais havia se comprometido tão completamente com material novo. Para muitos espectadores, o intervalo do Super Bowl é um momento de nostalgia, uma chance de reviver os maiores sucessos de um artista. Lamar, no entanto, recusou-se a ceder a essa expectativa.

“Ele não está aqui para agradar a todos”, disse Hiatt durante o podcast. “Ele está aqui para fazer uma declaração.” Essa declaração foi clara: Lamar não é um artista preso ao passado. Ele está constantemente evoluindo, desafiando as expectativas e usando sua música para abordar questões sociais e políticas urgentes.

 Política e Cultura no Intervalo do Super Bowl  

A apresentação de Lamar também foi marcada por mensagens políticas sutis, mas poderosas. Em um momento icônico, seus dançarinos formaram uma bandeira humana dos Estados Unidos, uma imagem que pode ser interpretada como uma crítica ao estado atual do país ou como uma celebração de sua diversidade. Essa ambiguidade intencional gerou debates acalorados, especialmente entre os críticos conservadores.

Como Spanos destacou, “os críticos conservadores parecem acreditar que vencer uma eleição significa que tudo o que eles não gostam na cultura vai de alguma forma desaparecer”. No entanto, a apresentação de Lamar foi um lembrete poderoso de que a cultura não pode ser controlada por uma única ideologia. “Você pode ganhar a Câmara, o Senado e a presidência, mas isso não significa que você assume a cultura”, acrescentou Hiatt.

Curiosamente, enquanto a performance de Lamar gerou indignação entre alguns conservadores, o hino nacional interpretado por Jon Batiste — que repetiu a frase “terra dos livres” três vezes, em uma clara mensagem política — passou praticamente despercebido pelos mesmos críticos. Como Sheffield observou, “foi uma performance muito pontiaguda”, mas que não recebeu a mesma atenção negativa que a apresentação de Lamar.

 A Divisão Cultural dos EUA em Destaque  

A reação à apresentação de Lamar cristalizou a profunda divisão cultural que define os Estados Unidos hoje. Para muitos, Lamar é um dos artistas mais importantes de sua geração, um mestre em usar sua música para abordar questões complexas como racismo, desigualdade e violência policial. Para outros, no entanto, sua música e sua mensagem são vistas como uma ameaça ao status quo.

Essa divisão foi evidente nas reações ao intervalo do Super Bowl. Enquanto alguns espectadores elogiaram a ousadia e a relevância de Lamar, outros criticaram sua escolha de músicas e suas mensagens políticas. No entanto, como Hiatt apontou, “isso é exatamente o que faz de Lamar um artista tão importante. Ele não tem medo de desafiar as expectativas e de usar sua plataforma para falar sobre o que realmente importa.”

A apresentação de Lamar no Super Bowl de 2024 será lembrada como um momento histórico, não apenas por sua ousadia artística, mas também por sua relevância cultural e política. Ao optar por focar em material novo e em mensagens urgentes, Lamar redefiniu o que um intervalo do Super Bowl pode ser. Ele transformou um espaço tradicionalmente apolítico em uma plataforma para discussões importantes sobre raça, cultura e poder.

Enquanto o país continua dividido, artistas como Lamar lembram-nos do poder da música para unir, inspirar e desafiar. Sua apresentação no Super Bowl foi um lembrete poderoso de que a cultura não pode ser controlada ou silenciada — e que, no final das contas, é a arte que molda o futuro.